Necessidade da mansidão e da humildade para o religioso
From book "Meditações de Santo Afonso de Ligório para cada dia do ano"... Discite a me, quia mitis sum et humilis corde; et ...
Discite a me, quia mitis sum et humilis corde; et invenietis requiem animabus vestris – “Aprendei de mim que sou manso e humildade de coração e achareis descanso para vossas almas” (Mt 11, 29)
Sumário. As virtudes que o Senhor exige particularmente dos religiosos que vivem em comunidade, são a humildade e a mansidão. Quem vive solitário nos desertos não precisa tanto delas; mas quem vive em comunidade, se não é manso e humilde, cairá cada dia em mil defeitos e passará uma vida inquieta, porque é impossível que não sofra ou repreensões do superior ou desgostos dos companheiros. Para que serve um religioso que não sabe suportar por Deus um desprezo, uma humilhação, uma contrariedade? Ele será sempre um soberbo ao qual a graça divina resistirá: Deus resiste aos soberbos.
I. O nosso amabilíssimo Redentor Jesus quis ser chamado Cordeiro, exatamente para significar quanto Ele era manso e humilde. Estas foram as virtudes que principalmente quis que de si aprendessem os seus discípulos: Aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração. E são estas também as que Jesus exige particularmente dos religiosos, que fazem profissão de imitar sua vida sacrossanta. – Quem vive solitário nos desertos não tem tanta necessidade destas virtudes; mas quem vive em comunidade, é impossível que não sofra ou repreensões dos superiores, ou desgostos dos companheiros. Pelo que um religioso que não ama a mansidão, cairá cada dia em mil defeitos, e passará uma vida inquieta.
O religioso é preciso que seja todo doçura para com todos, estranhos e companheiros, e ainda para com os súditos, se é superior; considerando, se é súdito, que lhe vale mais um ato de mansidão em suportar os desprezos e as repreensões, do que mil jejuns e disciplinas. – Dizia São Francisco, que muitos põem a sua perfeição nas mortificações externas e depois não sabem suportar uma palavra injuriosa; não compreendem que se adquire maior mérito pelo sofrimento das injúrias. Quantas pessoas – pondera ainda São Bernardo – , são todas doçura, quando não se diz ou não se faz nada contra o seu gênio; mas depois, nas ocasiões contrárias, fazem conhecer a sua pouca mansidão!
Quem é superior, note que aproveitará mais aos súditos uma repreensão feita com doçura do que cem outras feitas com aspereza. Mansuetus utilis sibi et aliis – “O manso é útil a si próprio e aos outros” , ensina São João Crisóstomo. – Em suma, como diz o mesmo Santo, o sinal mais certo de uma alma virtuosa é vê-la mansa nas ocasiões. Um coração manso faz as delícias do mesmo Deus que nele se compraz: Beneplacitum est illi fides et mansuetudo (1).
II. Para estar sempre disposto a suportar em paz as injúrias, é bom que o religioso nas suas meditações se represente os diversos encontros que lhe podem sobrevir e se arme contra eles; e depois, nas ocasiões, deve fazer-se violência, para não se perturbar, nem prorromper em impaciências. Por isso deve abster-se de falar, quando o ânimo está exaltado, até que veja que está acalmado. – Mas é sobretudo necessário ter um grande fundo de humildade. Quem é verdadeiramente humilde, não só não se perturba quando se vê desprezado, mas até com isso se alegra e se enche de júbilo (ainda que a carne ressinta), vendo-se tratado como julga que merece e feito semelhante a Jesus Cristo, que, sendo digno de toda a honra, quis por amor de nós ser saciado de opróbrios e injúrias. – Os santos foram mais ávidos de desprezos do que o são de aplausos e honras os mundanos. E para que serve um religioso que não sabe suportar um desprezo por Deus? Ele será sempre um soberbo, ou um humilde só de nome e fingido, ao qual a divina graça resistirá, como diz o Espírito Santo: Deus superbis resistit, humilibus autem dat gratiam (2) – “Deus resiste aos soberbos, mas dá a graça aos humildes” .
Ó meu humildíssimo Jesus, que por meu amor fostes tão humilhado e Vos fizestes obediente até à morte de cruz! Como tenho ânimo de me apresentar diante de Vós e chamar-me vosso imitador, vendo-me tão pecador e tão soberbo que não posso suportar sem ressentimento um só desprezo? D’onde me vem tão grande soberba, a mim, que pelos meus pecados tantas vezes mereci ser calcado eternamente aos pés dos demônios no inferno? Ah, meu Jesus desprezado, ajudai-me, fazei-me semelhante a Vós. Quero mudar de costumes. Vós, por meu amor, sofrestes tantos opróbrios; eu também por vosso amor quero suportar todas as injúrias.
Meu Redentor, fizestes muitos honrosos e desejáveis os desprezos, desde que os abraçastes em vossa vida com tão grande amor. Mihi absit gloriari, nisi in cruce Domini nostri Iesu Christi (3) – “Longe esteja de mim o gloriar-me, senão na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo”.
– Humildíssima Senhora e Mãe de Deus, Maria, vós que em tudo, mas particularmente no sofrer, fostes a mais semelhante a vosso Filho, alcançai-me a graça de suportar em paz todos os ultrajes que de hoje em diante me forem feitos.
Referências:
(1) Eclo 1, 34 (2) 1 Pd 5, 5 (3) Gl 6, 14
(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo III: Desde a Décima Segunda Semana depois de Pentecostes até o fim do ano eclesiástico. Friburgo: Herder & Cia, 1922, p. 24-27)
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