Grandes penas de Jesus sobre a cruz
Do livro "Meditações de Santo Afonso de Ligório para cada dia do ano"... Despectum et novissimum virorum, virum dolorum et ...
Despectum et novissimum virorum, virum dolorum et scientem infirmitatem – “O mais desprezado e o último dos homens; homem de dores e experimentado nos trabalhos” (Is 53, 3)
Sumário. Contemplemos Jesus suspenso no madeiro infame, cheio de dores e tormentos. Por fora está dilacerado pelos açoites, pelos espinhos e cravos; cada um de seus membros tem seu sofrimento particular. Por dentro está aflito e triste, desolado e desamparado de todos, mesmo do seu divino Pai. O que, porém, o atormenta mais é a vista dos pecados a serem cometidos pelos homens, remidos ao preço de seu sangue. Ah! Meu Redentor, eu também sou um dos ingratos que então vistes. Quem me dera ter morrido e nunca mais Vos ter ofendido!
I. Jesus na cruz! Que espetáculo foi para os anjos do céu verem um Deus crucificado! Que impressão nos deve também fazer contemplarmos o Rei do céu suspenso num patíbulo, coberto de chagas, desprezado e amaldiçoado de todos, em agonia e morrendo de dor, sem consolação! Ó céus, porque é que padece tanto o divino Salvador, inocente e santo: padece para pagar as dívidas dos homens. Onde se viu jamais tal espetáculo? O Senhor morrer por seus servos! O Pastor morrer por suas ovelhas! O Criador sacrificar-se todo pelas suas criaturas!
Jesus na cruz! Eis aí o homem de dores, predito por Isaías: virum dolorum . Ei-lo sobre esse madeiro infame, atormentado exterior e interiormente. Exteriormente está dilacerado pelos açoites, pelos espinhos e pelos cravos; de toda a parte corre o sangue e cada um de seus membros tem o seu sofrimento particular. Interiormente está aflito e triste, desolado e abandonado de todos, até de seu próprio Pai. – Mas o que mais o atormenta no meio de tantas dores é a vista horrenda de todos os pecados, que ainda depois de sua morte seriam cometidos pelos homens remidos ao preço de seu sangue.
Sim: os ódios, os pecados impuros, os furtos, as blasfêmias, os sacrilégios, numa palavra, todos os pecados se apresentaram então aos olhos de Jesus Cristo e cada um deles, com a sua malícia própria, veio, qual fera cruel, dilacerar-lhe o Coração. – Queixava-se então Jesus: É assim, ó homens, que se me pagais o meu amor? Ah, se vos soubesse agradecidos, morreria satisfeito! Mas, o ver tantos pecados depois de tantas dores; tamanha ingratidão depois de tão grande amor – eis o que me faz morrer de pura tristeza. – Ah, meu Redentor! Entre esses ingratos me vistes também a mim com todos os meus pecados.
II. Meu amabilíssimo Jesus! Eu também concorri grandemente para Vos atormentar na cruz, sobre a qual estáveis morrendo por mim. Oxalá tivesse eu morrido e jamais Vos tivesse ofendido! Meu Jesus e minha esperança, assusta-me a morte pela lembrança de que então terei de dar contas de todas as injúrias com que paguei o amor que me haveis tido; anima-me, porém, a vossa morte e me faz esperar o perdão. Pesa-me de todo o coração de vos ter desprezado. Se pelo passado não Vos amei, quero amar-Vos durante todo o resto da minha vida, e quero ser e padecer tudo para Vos agradar. Ajudai-me, meu Redentor, que morrestes na cruz por meu amor.
Senhor, dissestes que, quando fôsseis exaltado sobre a cruz, havíeis de atrair-Vos todos os corações: Et ego, si exaltatus fuero a terra, omnia traham ad meipsum (1). Pela vossa morte na cruz já arrebatastes ao vosso amor tantos corações, que por Vós deixaram tudo, bens, pátria, parentes e vida. Suplico-Vos, arrebatai também o meu coração, que, pela vossa graça já suspira por Vos amar; não permitais que ainda ame o lodo da terra, como no passado tenho feito.
Quem me dera, ó meu Redentor, ver-me despojado de todo afeto terrestre, afim de que, esquecendo tudo, só me lembre de Vós e só a Vós ame! Espero tudo da vossa graça. Conheceis a minha impotência; ajudai-me, eu vô-lo peço, pelo amor que Vos fez aceitar uma morte tão dolorosa no monte Calvário. Ó morte de Jesus, ó amor de Jesus, apossai-vos de todos os meus pensamentos, de todos os meus afetos, e fazei que de hoje em diante não pense em outra coisa senão em amar a Jesus. Amabilíssimo Senhor, atendei-me pelos merecimentos de vossa morte. – atendei-me também vós, ó Maria, que sois Mãe de misericórdia. Rogai a Jesus por mim; as vossas súplicas podem fazer-me santo e é isso o que espero.
Referências:
(1) Jo 12, 32
(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo III: Desde a Décima Segunda Semana depois de Pentecostes até o fim do ano eclesiástico. Friburgo: Herder & Cia, 1922, p. 17-19)
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