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Terça-feira da Segunda Semana depois da Epifania

Remorsos e desejos de um pecador moribundo

Do livro "Meditações de Santo Afonso de Ligório para cada dia do ano"... Angustia superveniente, requirent pacem, et non er...


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Meditações para todos os dias

Santo Afonso

Angustia superveniente, requirent pacem, et non erit – “Ao sobrevir-lhes de repente a angústia, eles buscarão a paz e não a haverá” (Ez 7, 25)

Sumário. Consideremos o estado infeliz de um moribundo que viveu mal, especialmente se era pessoa consagrada a Deus. Que remorso lhe causará o pensamento de que, com os meios que o Senhor lhe proporcionou, até um pagão se faria santo! Desejará então um instante daquele tempo que agora se perde, ou é empregado no pecado, mas em vão. Irmão meu, a fim de que não tenhamos tal desgraça, tomemos agora as resoluções que então havíamos de tomar. Talvez seja esta a última vez que Deus nos chama.

I. Como se deixam bem conhecer no momento da morte as verdades da fé, mas para maior tormento do moribundo que viveu mal, especialmente se era pessoa consagrada a Deus, já que, para o servir, tinha mais facilidade, mais exemplos, mais inspirações. Ó Deus, que pena será para essa pessoa pensar e dizer: “Repreendi os outros e fiz pior do que eles! Deixei o mundo e vivi ligado aos gozos, às vaidades e às afeições do mundo!” Que remorso lhe causará o pensamento de que, com as luzes que recebeu de Deus, até um pagão se teria feito santo! Que dor não sofrerá, lembrando-se de ter ridicularizado as práticas de piedade dos outros como fraquezas de espírito e de ter louvado certas máximas do mundo, de estima ou de amor próprio!

Desiderium peccatorum peribit (1) — “O desejo dos pecadores perecerá” . Quanto será desejado na morte o tempo que se perde agora! Conta São Gregório, nos seus Diálogos, que um homem rico, mas de maus costumes, chamado Crisâncio, estando a ponto de morrer, gritava aos demônios que lhe apareciam visivelmente para se apoderar de sua alma: “Dai-me tempo, dai-me tempo até amanhã.” Respondiam os demônios: “Ó insensato, é nesta hora que pedes tempo? Tiveste tanto tempo e perdeste-o, empregaste-o a pecar, e agora é que pedes tempo? Já não há mais tempo.” O desgraçado continuava a gritar e a pedir socorro. Próximo dele achava-se um seu filho chamado Maximo, que era monge. Dizia-lhe o moribundo: “Socorre-me, filho, meu caro Maximo, socorre-me!” No entanto, com o rosto chamejante, volvia-se de um para outro lado do leito, e nesta agitação e gritos de desespero, expirou desgraçadamente.

Ó céus! Durante a vida, aqueles desgraçados comprazem-se na sua loucura, mas na morte abrem os olhos e reconhecem quanto foram insensatos; mas isto então lhes serve tão somente para aumentar o seu desespero de remediarem o mal que fizeram. — Meu irmão, penso que ao leres estas reflexões, dirás: É verdade; é mesmo assim. Mas se é verdade, muito maior seria a tua loucura e a tua desgraça, se, reconhecendo a verdade na vida, não te aproveitasses dela a tempo. Esta mesma leitura, que acabas de fazer, ser-te-á no momento da morte uma espada de dor.

II. Eia pois, já que te é dado tempo de evitar tão deplorável morte, dá-te pressa em aproveitá-lo: não demores até que venha o tempo em que não poderá remediar o mal. Não demores sequer um mês, nem sequer uma semana. Quem sabe se a luz que Deus te dá agora na sua misericórdia, não é a última graça e a última exortação que te faz? É loucura não querer pensar na morte, que é certa e da qual depende a eternidade; mas maior loucura ainda é pensar nela e não se preparar. Faze agora as reflexões e resoluções que farás então; agora com fruto, então sem fruto; agora com a confiança de te salvar, então com grande desconfiança de tua salvação. — A um fidalgo, que se despedia da corte de Carlos V, a fim de viver unicamente para Deus, perguntou o imperador, porque deixava a corte. “Porque é necessário”, respondeu ele, “que exista um intervalo de penitência entre uma vida desordenada e a morte.”

Não, meu Jesus, não quero continuar a abusar da vossa misericórdia. Agradeço-Vos a luz que hoje me dais, e prometo-Vos mudar de vida. Quanto me consola o que dissestes: Convertimini ad me, et convertar ad vos (2) — “Convertei-vos a mim e eu me converterei a vós”. Afastei-me de Vós por amor das criaturas e das minhas miseráveis satisfações; agora deixo tudo e converto-me a Vós. Estou certo de que não me repulsareis, se eu quiser amar-Vos, porquanto me dizeis que estais pronto para me acolher em vossos braços. Convertar ad vos — “me converterei a vós” . Recebei-me na vossa graça, fazei-me conhecer o grande bem que em Vós possuo e o amor que tivestes para comigo, a fim de que não torne a deixar-Vos.

— Perdoai-me, ó meu amado Jesus, perdoai-me; meu Amor, perdoai-me todos os desgostos que Vos tenho causado. Dai-me o vosso amor e fazei de mim o que quiserdes. Castigai-me, como entenderdes; privai-me de tudo, mas não me priveis da vossa graça. Venha o mundo todo a oferecer-me todos os seus bens; protesto que só Vos quero a Vós e nada mais.

— Ó Maria, recomendai-me a vosso Filho; Ele vos concede tudo quanto pedis; em vós confio.

Referências: (1) Sl 111, 10 (2) Za 1, 3

(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I: Desde o Primeiro Domingo do Advento até a Semana Santa Inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 159-161)

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